segunda-feira

O saudosismo do fim. Fim?


Há arrastados dias atrás (muito dias, aliás), cá estava, sedenta de conhecimento, ansiosa para trilhar um caminho que sequer sabia onde me levaria... Caminho longo. Longos dias...
Falar da jornada que trilhei só não pode ser mais cansativo que a trilha em si e suas teimosas pedras a calejar-me e, por isso mesmo, não quero fazer uma 'retrospectiva' detalhada de quem eu era quando escrevia sobre a inesperada aprovação no vestibular para o curso de Direito e advogada, forte advogada que vim a me tornar. Quem sabe assim, discorro sobre algumas batalhas que travei comigo mesma e com aqueles que tentaram me parar, vejamos se conto alguns episódios épicos que, ao final, revelem um pouco do que sobrou da pequena menina, agora mulher.

O desejo que impulsiona um acadêmico em Direito, muitas vezes transcende a busca por uma profissão. É claro que ainda existem aqueles de brilhantes olhos pelo dinheiro, os filhos dos já Doutores e os que, por acidente acabam nas salas de aula de uma das cadeiras mais fantásticas do ensino universitário. Mas como eu ia dizendo, muitos, e aí me atrevo a me incluir, estão aqueles que vislumbram nas ciências jurídicas um meio para servir a sociedade, submeter o todo à um mínimo de ordem, levar justiça onde se atropelam o direito, defesa aos que carecem de oportunidade, ataque aos que buscam um voz no Tribunal, dialética aqueles que se sentem calados pelo sistema, pelo esperto, pela empresa malandra, pelo acidente injusto, pela ofensa desmedida, pela falta do alimento ou simplesmente aquele que se vê esquecido no meio da multidão, desacreditado que todos os utópicos direitos garantidos pela Constituição, se releguem a um pragmatismo capitalista que há muito se mostra incontrolável. É, existem aqueles que estudam, se desdobram e se tornam instrumentos para planejamento e assessoria de grandes empresários, conferindo eficiência aos seus caixas, e isso não é errado... Existem aqueles sim, que vão lançar mão disso tudo para servir à margem da ética e da moral, esquecendo os princípios basilares do operador do Direito que cinge-se à luta pela justiça, interpretando-a a seu bel prazer ainda que em detrimento do próprio Direito.
De fato aprendi que existem sempre 3 verdades: a minha, a sua e verdade em si, e enquanto isso vamos brincando de "conhecedores" dessa verdade conforme a demanda, certo? Aiai...

Sentei por aqui e escrevi sobre o Direito com um olhar tão ingênuo e limitado que hoje, ao tê-lo um pouco mais desvendado, expandido e ligeiramente compreendido, digo que tudo o que sei... é que nada sei. É sério isso! Não quero só brincar de parafrasear, eu realmente me sinto um grão de areia em um mar de conhecimento, ainda muito cru, que precisa ser desbravado demais ainda...
Veja bem, meu bem, como vou dizer pra você o quanto o Direito me modificou se agora mesmo é que começo a me ver com os olhos de quem questiona, impugna, relata, defende e acusa, simultaneamente?
O que posso dizer é que não sou quem eu pensava que era, e nem sei ainda qual vai ser o resultado disso pois a única certeza que ainda tenho é que ainda sou uma "metamorfose ambulante" que tem agora uma meta, um objetivo, um ideal, um sonho, um longo caminho pra trilhar...
Olho pra trás e vejo muito esforço, algumas contradições, muitas mudanças de opiniões, conhecimento a flor da pele, sede, muita sede de justiça, um ideal cheio de vida, natural àqueles que iniciam carreira, e olhos brilhantes por ter descoberto, muito além de um ofício, uma vocação... Muito além de uma profissão, um prazer, mais que um diploma em mãos, a honra por vestir essa toga negra e falar pra ser ouvida, mesmo que isso mude uma percentagem quase que imperceptível a vida das pessoas, fazendo do Direito o instrumento mais justo e digno pra se encontrar aquilo que mais se aproxima da verdade.
E por mais que o dia de hoje represente um termo, é também uma 'vírgula' na vida, onde tomamos impulso e continuamos no mesmo verso, porque a formatura pode ser um ponto final, mas é também o meu ponto de partida.
Levo no peito as lembranças doces das pessoas, ah! Como são lindas as pessoas que conheci...
Levo o amor no coração pelos Mestres, fantásticos e inspiradores professores, que tive a honrar de prestigiar...
Guardo a necessidade do estudo constante, da busca, da humildade, do silêncio quando não compreendo, do benefício da dúvida quando pressinto, e do grito alto quando tenho a convicção de algo. Porque aprendi que não basta saber o que falar, é preciso saber quando, onde e se realmente fará a diferença, bem como aprendi que falar pra idiotas é um tremenda perda de tempo.
Hum... Vamos falar sobre o que aprendi? Um pouco, claro! Ou quase nada...

É... Aprendi que é fantástico estar munido de conhecimento e que o argumento é a mais letal arma, pois o ser intelectual demonstra humanidade e inteligência, e isso divido os meninos dos homens... Ah, e que o tom do que se fala não tem tanta importância quando se sabe o que tem que dizer.

Aprendi que esse mesmo argumento, ao passo que se mostra um instrumento pacífico de solução de litígios, pode ser tão pérfuro-contundente quanto uma tesoura, e isso pode ser bem perigoso e nos faz totalmente responsáveis pelos resultados. Aprendi que devemos prever os resultados e, logo, manusear o argumento (a língua) de forma precavida e cuidadosa para o tiro não sair pela culatra.

Aprendi que tudo que é mais difícil é melhor... Desculpa, mas é verdade. Passar em um prova sem estudar pode ser legal e demonstra sua habilidade de driblar a sorte, a vida, o examinador e você mesmo, mas passar por ter estudado pra cacete tem gosto do vinho mais doce e harmonioso do sul da França... Por que você não precisou de sorte, só provou que é mais que a habilidade de driblar, tem a habilidade do saber, e isso, meu caro, não tem preço.

Aprendi que por mais cansativo que seja ter um terceiro e quarto turno no meu dia, após um cansativo dia de trabalho, problemas em casa, família problemática e várias crises existenciais, o prazer de aprender e estudar o que se ama supera o cansaço e funciona como mola propulsora, empurrando pra frente... Houveram meses que enlouqueci e fazia faculdade em dois turnos e trabalhava 8 horas no meio disso... Sei que a matemática não bate e nem eu sei como foi que consegui, mas ao final de tudo, ir a aula e ouvir sobre crimes contra dignidade sexual, o direitos reais, contratos, lançamento do crédito tributário, prescrição intercorrente e etc. me motivava e me aquecia, não me deixando esquecer de quão mágico era aquilo tudo na minha mente. Aprendi que escolhi o caminho certo e isso foi meu combustível. Aprendi que quando temos o combustível certo, cacth on fire!

Aprendi que aqueles que estão ao nosso lado provam seu amor por nós quando os surpreendendo terminando o jantar à meia-noite, aguardando nossa chegada em casa, com um sorriso lindo no rosto, que nos conforta, nos acolhe, nos abraça e nos dá força para repetirmos todo esse ritual amanhã. Aprendi a valorizar isso.

Aprendi que finais de semana não existem para ficarmos de pernas pro ar. Existem para colocarmos a leitura em dia e eles são uma benção no final do semestre hehehe... Os finais de semana gastamos com o que gostamos de fazer, e aprendi que gosto de aprender quanto descobri que estudava sem ter provas, redigia uma peça sem ter prazo, lia Herberman só pra confundir minha cabeça e depois sentir o 'plin-plin' ao compreender algo do que ele dizia. Me peguei filosofando jurídicamente. Faz ideia de como isso pode ser assustador?

Aprendi que gosto de ensinar. 'Ensinar? Mas você acabou de dizer que não sabe de nada..."
Sei disso. Mas o pouco que sei, gosto de ensinar... E foi assim que pude ajudar tantas pessoas durante esse tempo... Ah! Se me fosse dada a oportunidade de aprender mais para ensinar mais também...

Aprendi que o ego é nosso maior inimigo... E que inimigos não são bobagens.

Aprendi que a noite é uma criança teimosa que gosta muito de Direito Tributário! Oh!!! Foi ela que me fez passar na OAB! ;)

Aprendi que quando alguém que amamos sente orgulho de nós, de quem nos tornamos, no nosso papel social é muito, muito melhor que o orgulho que sentimos de nós mesmo, porque a maioria das vezes que essas pessoas nos olham, elas veêm muito além da nossa visão limitada sobre nossa capacidade, e enxergam mais, acreditam mais, mesmo quando nem nós mesmo acreditamos.

Aprendi que quando fazemos o que amamos, não sofremos por fazê-lo.

Conclui que não sei quem vou ser daqui a cinco anos, assim como não sabia a cinco anos atrás quem eu seria (e olha que eu jurava que seria o mesmo cachorrinho com o rabo entre as pernas, perdida entre opiniões alheias a meu respeito e, veja então...), não sei onde vou estar trabalhando, ou se vou ao menos estar. Pode ser em uma sala de aula, em um Tribunal, em um escritório, em uma empresa, em um outro órgão, em algum outro cargo... Mas o que anseio hoje é pela benção de poder manusear a lei, compreender a norma, escrever o Direito, exigir a ordem, advogar pela justiça, colocando em prática o que aprendi até aqui, e guardando no bolso todos os outros ensinamentos que vou colhendo pelo caminho.

Vou ser diferente, graças a Deus. Vou ser melhor, por favor. Vou ser mais eu que nunca, e espero, sinceramente, nunca desacreditar na justiça humana, por mais falha e tardia que seja, por mais dificíl que seja, basta-me força para lutar e fé. Fé na justiça dos homens, para não permitir cair por terra todo meu ideal.

Mas resumindo...
Estudei muito. Aprendi demais. Demais mesmo...
Dormi pouco. Sofri bastante. Meu cabelo caiu, minhas unhas quebraram, meus pés cansaram, minhas costas doeram (doem ainda e acho que esse é um souvenir do curso!), mas persisti.
Fui contra aqueles que desacreditaram e com olhares pesarosos me questionaram pela minha escolha e me aconselharam a escolha de um curso mais fácil... Não os escutei. Fechei os olhos a todos estes, e dia a dia provei que eu era mais forte que isso para que hoje, eu levantasse os meus olhos e os visse, surpresos, estupefatos e obrigados a engolir a minha conquista. Minha!
Comi pouco por muito tempo e em fase de TCC comi demais.
Corri contra o tempo. Esqueci de mim. Esqueci minha família algumas vezes. Me permiti respirar o Direito e estar em constante contato com ele por dias, em alguns dias eu não tinha pausa disso... Era 12, 14 horas por dia pensando isso, dentro disso, mergulhada e consumida. Foi mágico!
Fiz muuuitas coisas ao mesmo tempo.. entre casamento, mudanças, reformas, trabalhos bem desgastantes, muitas matérias ao mesmo tempo, chefes surtados, cuidando de uma casa, outra mudança, uma construção, uma OAB em Direito Tributário, algumas monitorias, comissão de formatura para eu ter como pagar a festa, disciplina de prática pela nas férias (ou sem férias), com o melhor e mais exigente professor que tive, monografia em um tema desgastante, e morando sabe-se-lá onde... Eu vi. Eu vim... E venci.
Escutei "louca", "sem noção", "egoísta"... Mas só sentia lá no fundo do coração a esperança de que eu podia conseguir e se não desse certo, paciência ué! e pra minha surpresa... não é que deu certo?! Ufa... fim.
Mas pra todo fim tem um novo começo, e eu estou pronta, cada vez mais pronta pra me superar, me provar, me testar, me irritar e ver que vale a pena. Estou pronta pra seguir. Estou pronta pra me descobrir... Mas forte que estive a quase 6 anos atrás, mais segura, mais confiante, mais calma, mais atrevida, mais inteligente, mais Fernanda.
Tá aí... O que foi que mais aprendi? Aprendi a ser mais Fernanda do que nunca!

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