Vida louca, quão louca
é essa vida... Dias que sim, dias que não. Natural. Normal. Faz parte... Sorrisos,
sexo, amigos, vinho, pizza, cartinha de amor, surpresa, pôr do sol, bons
livros, esmalte vermelho, mãe, “te amo” antes de dormir... Mas há outros que
definitivamente não merecem ser registrados, embora fatalmente sejam vividos
até o fim. Dias em que nosso coração aperta, lágrimas, nariz entopido, dor de cabeça,
fome, cara emburrada, distância, falta, ausência, palavras que cortam feito
faca, dor, vontade de sair sei lá pra onde, desejo de não voltar, o “querer”
mudar-sair-gritar-chorar...
Em tempos de facebook,
cremos que a vida das pessoas são feitas sempre de dias felizes: aquele dia na
praia, em Praga, no bar, na casa dos primos vendo filme e comendo pipoca, na
piscina da casa do pai, no parque correndo, nos melhores restaurantes da
cidade... Claro! Ninguém quer ou registra aquele dia em que o chefe está mal
humorado, aquela briga com o marido desde cedo, aquela preguiça de ir à
academia, a comida em um self service qualquer... Ninguém registra os dias de cólica,
de amores não resolvidos, do sexo não feito, a falta de dinheiro... Mas esses
dias são tão mais comuns em nossas vidas que não registrá-los parece-me um
passo no caminho da ilusão, da fantasia, da irrealidade. Explico. Não quero
dizer que devemos publicar para todo mundo assistir a nossa “nada mole” vida,
sei bem que no fundo gostamos que pensem que pra nós as coisas não estão tão difíceis
e que sorrimos mais do que choramos. É mesmo bom que ninguém saiba das nossas
lutas diárias e como damos um duro danado pra ajeitar as coisas ao nosso redor
e que de “mole”, nossa vida não tem nada.
Aí ontem, recebi a
carteira da OAB e fato, foi uma emoção maravilhosa, sensação de dever cumprido,
de conquista, de ter uma profissão pra chamar de minha, de ter nadado, nadado e
ter chegado à praia, cansada, sem saber o que fazer agora ou mesmo por onde
começar, com medo, insegurança, desempregada... Mas a foto não diz isso. A foto
mostra um sorriso estampado no rosto e um lista enorme de “parabéns”, deixando transparecer
apenas o lado bom da vida. Isso representa um registro de um dia bom. Ou ao
menos é o que parece. Só parece. Porque ninguém sabe o que passou pela minha
cabeça durante todo aquele dia... Ninguém sabe da minha angustia por ter
vendido meu carro e não ter como ir na cerimônia de entrega, ninguém sabe o
quanto fiquei triste por pensar que meu marido não estaria presente, ninguém sabe
que enquanto saia do prédio, com a carteirinha na mão e olhando pro meu numero
glorioso de inscrição na ordem pensei: “e agora??”.
A gente não mostra o
nosso lado ruim, nosso lado triste, nosso lado inseguro e medroso. Ainda bem!
Afinal, seria um saco viver dando de cara com a face oculta e sombria de cada
um que nos rodeia. Mais saco ainda, ter que nos lembrar todos os dias que
apesar dos sorrisos nas fotos, dos lugares incríveis para os quais viajamos, os
restaurantes maravilhosos que conhecemos, existe dentro de cada um de nós, na
vida de todos, sentimentos, pensamentos e lagrimas que ocultamos pra não assustar
ninguém... e dias... Ah esses dias... Que não gostaríamos de registrar.
Contudo, como de
costume, é bem essa tristeza velada que me inspira, que me move pra cá, para um
desabafo sem ouvinte, lamento sem som, frustração sem holofotes, choro sem plateia...
Bem do meu jeito, escondido, calado, guardado só pra mim, porque ninguém vai
entender o universo de sentimentos e sensações que se passam aqui dentro,
ninguém quer ouvir sem falar, ninguém que ser criticado sem se justificar,
ninguém quer saber só pra ajudar, ninguém fica sabendo sem julgar, ninguém vai
te ver nos seus piores dias e com todo pessimismo que tem direito sem lançar um
discurso: “onde esta o lado bom da situação?!” embebedado de intenção de te
fazer parar, estancar, calar a tristeza, o choro, o seu lado feio e seus dias ruins. E por isso
guardo, guardo de novo, em um lugar pra ninguém ver e com isso não julgar,
criticar, justificar, e me encher o saco com um lado bom que as vezes eu
simplesmente não consigo ver.
Prefiro que vejam fotos sorridentes de quando, passei na OAB, colei grau
com honrarias, peguei a carteira profissional, recebi flores do marido, um
abraço de uma amiga, assiti um belo pôr do sol, e pensem por um instante que as
coisa vão bem por aqui... Porque na verdade, ninguém precisa saber que quando
passei na OAB estava com os dedos feridos de tanto escrever; quando colei grau
estava com as costas destruídas depois de passar semanas pintando a casa,
quando peguei a carteira estava profundamente preocupada com o que eu
trabalharia a partir de então; que tenho muito mais difíceis no casamento que
recebo flores, e que por trás daquele pôr do sol da foto, estava eu com
lágrimas nos olhos, escondendo dias ruins que não merecem ser registrados, mas
nem por isso deixam de existir.
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